Muitas entidades andam se debatendo sobre o futuro do associativismo, em especial as entidades empresariais, e como são formadas por empresários, o empreendedorismo empresarial acaba sempre falando mais alto, ou seja, não conseguem enxergar além de como faturar, e como praxe empresarial, faturar significa produzir e vender. Eis o começo do problema. Não somos empresa. Somos entidade, nossa missão é transformação social. Mas como sobreviver sem faturar? Eis o dilema que tem distorcido e confundido toda a sociedade.
Sabemos que nosso maior desafio é manter o equilíbrio de forças entre governo e empresas. Governos com muito poder escravizam e se tornam autoritários. Empresas com muito poder escravizam e formam oligarquias. Nem um nem outro, porém não podemos acabar com eles, precisamos de ambos mas precisamos também do equilíbrio. Esta é a essência do associativismo.
Existem alguns estudos sociais que apontam que a sociedade americana está lentamente sendo enfraquecida em seus pilares democráticos justamente por promover um rápido avanço e fortalecimento de empresas. Grupos poderosos detentores de muito capital, muita tecnologia e muito know how empresarial estão formando verdadeiros impérios em vários segmentos, desequilibrando a balança de forças entre governantes e empresas, onde os interesses econômicos e políticos acabam por suplantar lentamente o conjunto de interesses da sociedade. Perigo à vista.
Não importa o quanto você percebe o relógio do tempo cumprindo sua missão e com ele o desenrolar dos fatos, nem tampouco se você acredita ou não. A história está em curso em todas as nações. Aforante as nossas crenças, urge salvar o terceiro setor e fazer com que ele cumpra o seu papel de pêndulo de equilíbrio, defendendo a democracia, vigiando a nossa liberdade e promovendo a solidariedade.
As entidades como todo movimento do terceiro setor encontra eco em suas aspirações na sociedade e com isso acaba encontrando o caminho do crescimento e seu real valor acaba sendo percebido por todos. Foi assim com o Cristianismo, após 220 anos de perseguição, depois de uma pandemia acabaram sendo reconhecidos como religião oficial do estado, adquirindo um poder acima do ideal sobre o estado e sobre a população. Os motivos que os levaram ao poder eram nobres e sagrados, porém por sua essência humana sucumbiu ante a volúpia de interesses pessoais presente entre os mandatários. A igreja tornou-se tão poderosa a ponto de definir, por ou depor reis e rainhas do mundo ocidental. Mas a volúpia os levou ao caminho da elitização, formação de grupos oligárquicos da aristocracia da época, ao caminho da politização partidária, onde somente os concordantes poderiam fazer parte e a mercantilização, comércio de produtos, equivocadamente chamados de “produtos da fé”, que serviam para abastecer os interesses daquela elite clerical. Nasceu pelo propósito, morreu pela falta dele.
Em muitas entidades as pesquisas apontam este mesmo efeito, com variações que vão de um extremo a outro, mas mantendo a maioria longe do propósito. É nítido que quanto mais longe do propósito, mais próximo está de uma elite, de uma política partidária e muito mercantil, que por um lado traz recursos imediatos mas por outro afugenta os associados.
Para restabelecer o caminho e produzir os efeitos que a sociedade necessita a entidade deve retomar o seu caminho em três fases: entender como o efeito elitização, politização e mercantilização está afetando a entidade; redefinir a jornada do associado; redescoberta do propósito, o “porquê” de sua existência.
Não há como seguir em frente se não tomar consciência de suas fragilidades e limitações. O primeiro passo é reconhecer para poder tratar. Na sequência precisa definir seu foco no associado. Não basta amar, é preciso demonstrar o quanto ama. Redefinindo a jornada do associado.
Toda relação tem um começo, meio e fim. A nossa relação atual pode estar muito mais focada em filiar, vender e perguntar se ele gostou do serviço do que numa relação de associados.
Urge apresentar uma proposta. Concreta e plausível. Ouso apresentar uma. Antes de mais nada, olhar para o associado e entender suas expectativas, seus sonhos, seus desejos. Aqui uma boa entrevista de expectativas para mostrar um diagnóstico inicial de cada associado se faz necessário. Desenvolver o acompanhamento para atender as expectativas (exceto o que não nos compete, mas isso tem que ser dito na hora, não permitir que entre com falsa expectativa). Acompanhar e monitorar o índice de satisfação do associado (somente NPS pode mostrar isso). Somente estes indicadores podem apontar e corrigir o rumo, o resto é achismo e comparativos com a iniciativa privada que em nada ou quase nada pode contribuir. E nos casos de desligamentos, a pesquisa NPS deve detectar o máximo possível o motivo em relação às expectativas. Esta entrevista é tão ou até mais importante que a inicial pois tem duplo objetivo: definir causas e falhas da nossa condução e manter nível de confiança na relação, assim acaba voltando.
Em síntese, tratar o associado como uma pessoa amada e não como um filiado, simples assim.
O autor Gilmar Denck é empresário com 30 anos de experiência em associativismo. Formado em Filosofia e Administração.
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