Antes da revolução cibernética o “pai dos burros” era o velho e bom dicionário. Ditado popular para denotar que no dicionário poderíamos encontrar a fonte sobre todas as nossas dúvidas em questões de conceitos, língua ou gramática.
Hoje, de forma evoluída, temos os sites de buscas, que em fração de segundos nos trazem muito mais informações que todos os dicionários do mundo, deixando nosso velho e bom dicionário apenas como o avô dos burros, ainda carregados de conhecimento, mas um tanto obsoleto. É a vida, diria o poeta. Mas nas relações interpessoais, a regra da evolução tem a mesma valia?
Vamos ver o que diz o Google sobre Interação: “Influência recíproca de dois ou mais elementos. 2. [Psicologia] Fenômeno que permite a certo número de indivíduos constituir-se em grupo, e que consiste no fato de que o comportamento de cada indivíduo se torna estímulo para outro“. Ao que me parece, as interações humanas foram facilitadas com o advento das redes sociais, mas ao que tudo indica, está cobrando seu preço, pois nitidamente na mesma proporção que as redes nos aproximam de quem está longe, têm nos afastado daqueles que estão por perto.
E percebam que quanto mais perto, mais afastados. É comum ver em mesas de bares e restaurantes os integrantes de uma mesma mesa conversando com o mundo pelo celular e distantes da conversa que transita na mesa. Estamos na era cibernética. As relações e interações estão sendo modificadas, entretanto, a sua essência em nada se alterou desde o princípio dos tempos. Somos seres dependentes e não sobrevivemos em bolhas.
Ainda não sabemos precisar os riscos ou as benesses que iremos colher, porém é importante refletir e perceber que com esta aceleração da evolução das interações cibernéticos e sua consequente redução das interações presenciais, fator exponenciado durante a pandemia, podemos estar acelerando ao mesmo tempo a polarização entre capital e o social, nos jogando aos seus extremos.
Não há vida econômica sem o capital, como também não há vida sem o social. Precisamos de capital e do social na mesma medida, mas quando dominados por aspirações imperialistas ambos se tornam perigosos e nefastos. Não há necessidade de dissertar aqui sobre as consequências, pois a História está repleta de exemplos para todos os lados. Sociólogos e cientistas de diversas áreas vêm se debruçando sobre os efeitos destas vieses, entretanto ao que me parece ainda estão distantes de suas causas raízes.
Ao meu ver, explicando aqui de forma simplista, toda a essência da vida está nas interações sociais em que podemos relacionar, nas quais, por inabilidade ou preguiça moral, temos uma tendência a nos afastar justamente porque nelas encontramos desafios e desilusões não desejadas, que ao mesmo tempo que machucam são as nossas melhores professoras.
As redes, com toda a parafernália de filtros e a distância que conseguimos manter com os interlocutores, trazem uma sensação de segurança e uma falsa ideia de que estamos isentos dos dissabores das interações. Ledo engano. Este efeito de se fechar em uma redoma, de um lado acelerado pelas redes, por outro lado lentamente nos faz regredir na evolução humana que depende essencialmente das interações.
Estamos cada dia mais rápidos em produzir indivíduos mais rápidos, com mais conhecimentos e mais produtivos, porém, por outro lado, sem aptidões para o convívio e para a cooperação. Neste quesito, mesmo que lentamente, estamos em marcha ré. Vivemos uma dicotomia. Estamos acelerando rumo ao futuro, ampliando nossa capacidade de produzir informações, ao mesmo tempo que em menor velocidade estamos navegando rumo ao passado em nossa evolução emocional.
Voltaremos a ser rudes, isolados e toscos no relacionamento, como imaginamos nossos homens da caverna que eram individualistas e agressivos? A resposta está na tua observação. Olhe ao seu lado. Curiosamente no mundo dos negócios uma das estratégias mais poderosas está justamente nas interações que podem provocar. Capital não é tudo na vida, mas não existe nada sem ele. Para obter capital precisamos essencialmente de vendas. Vendas também não são tudo na lide empresarial, mas sem elas não existe nada.
E muito poucas coisas podem produzir mais vendas e de forma perene que os relacionamentos. A interação sempre foi a base da evolução humana. Tudo que existe nasceu das interações. Hoje na net podemos acelerar relações virtuais e acelerar o conhecimento técnico, mas nada suprime a evolução que uma interação produz, imagina um conjunto de interações.
É lógico que num conjunto de interações encontraremos dissabores e efeitos indesejados, mas são eles que nos ensinam a cooperar e se beneficiar do efeito mágico exponencial que só a cooperação pode produzir. Estamos num momento magnífico da humanidade no que tange às evoluções tecnológicas que tanto nos beneficiam, porém olhar com carinho para as interações pessoais não é olhar para trás, pelo contrário, é olhar com firmeza para o futuro e parear nossa evolução tecnológica com nossa evolução emocional, única capaz de nos fornecer significância na caminhada. Pare e pense. O caminho existe. O caminho é ASSOCIAR. Vamos trilhar.
O autor Gilmar Denck é empresário com 30 anos de experiência em associativismo, formado em Filosofia e Administração.
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